segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Sobre o Filme



GÊNESE E CONTEXTO DO FILME

Cultura, o tema obstinado. Só faltava acontecer.
Havia interesse, mas pouco conhecimento sobre um mito regional. Logo brotou a ideia de produzir um documentário com uma abordagem antropológica cultural acerca da narrativa mítica. Embora tivesse experiência com direção e roteiro de demais produções audiovisuais, produzir um curta-metragem seria uma experiência cheia de novidades.

O mito sob um olhar estrangeiro, o olhar etnográfico.
O mito em questão se delineia por apresentar uma mulher cujo túmulo foi acorrentado e o corpo virou uma serpente.

Eventualmente, há quem questione a veracidade do mito inerente da região conhecida como Capim - em Rive, que pertence ao município de Alegre, no Caparaó capixaba, sul do Espírito Santo. Tal indagação entre os populares culminou na curiosidade individual sobre o conto popular. As primeiras tentativas de investigação foram insuficientes, ofereciam direção limitada. Mas o empenho e a persistência foram gratificados nas tentativas que se seguiram.

Compreendido no contexto do século XIX e primeiras décadas do século XX, um mito tão antigo limita em quantidade e/ou qualidade as fontes de pesquisa, principalmente a história oral. Tentou-se obter depoimentos que apresentassem autenticidade e variação na sua forma, observando que contos míticos são peculiarmente formados por diversas ramificações.
O processo de coleta de fontes da história oral sobre o objeto de pesquisa foi um exercício que inspirou simpatia. O depoimento dos entrevistados por vezes foi indiferente ou regular ao assunto, enquanto outros o engrandeciam, demonstrando empolgação e um forte envolvimento com o mito. Mais além, deparou-se com depoimentos que seriam imprescindíveis para formação do juízo de desmitificação. Seja como for, o mito está presente e provoca o imaginário popular.
Os atores sociais foram selecionados tendo como critério o conhecimento e vivencia da narrativa mítica, e por apresentar opinião no âmbito da desmitificação, além de ser natural de Alegre ou região do Caparaó-ES.

Ao explorar aspectos fúnebres, entende-se que o assunto provoque estranheza. No entanto, é possível conferir a oferta de historicidade e a apreciável arte tumular que há no(s) cemitério(s).
Visitou-se o cemitério estabelecido na fazenda São Luiz – região do Capim/Rive, conforme o direcionamento contido nos relatos. O cemitério abriga túmulos de escravos e arte tumular do século XIX. Contudo, o foco era a sepultura que pertencera à serpente. O túmulo, embora vandalizado, possibilitou a identificação da personagem do mito. Na lápide constavam alguns nomes que se denominavam de filhos, e ao lado do túmulo está sepultada uma filha. Outra grande surpresa foi encontrar um pedaço da corrente, esta esboçada pelo evento sobrenatural.  
Os dados obtidos foram confrontados com a bibliografia sobre os colonizadores de Alegre e, desta forma, pode-se elucidar o mistério. Segundo a pesquisa, a serpente se tratava de Prudenciana Aguiar Paiva ou Prudenciana Umbelina de Aguiar Paiva.
E na visita ao cemitério municipal de Alegre, pode-se verificar os jazigos de entes da família de Prudenciana, os Ferreira Paiva e Aguiar Paiva.

O conto também cita a mão-de-obra escrava e o período de transição para o trabalho livre no Espírito Santo, principalmente na região sul do estado.

A religiosidade, considerado um assunto delicado para ser tratado. Contudo, a proposta do documentário foi muito bem recepcionada. A história de Alegre e região se construiu atrelada à religiosidade, principalmente, a católica.

Segundo relatos, um volume considerável de dados documentais e de patrimônio arquitetônico rural sofreu danos ou foi completamente destruído em decorrência de inundações no município. Mesmo assim, foi possível localizar dados de manuscritos, registros em cartório e registros fotográficos que representam fragmentos da realidade social. Como também não foi possível visitar a sede da fazenda São Luiz e de outras fazendas que pertenceram aos colonizadores de origem portuguesa. Todavia, encontrou-se uma pequena propriedade rural que reproduz com fidelidade características da arquitetura rural do século XIX.

Entre embaraços e triunfos, a pesquisa conquistou corpus plausível para a realização da proposta cinematográfica. Assim, o documentário “A Serpente do Túmulo Acorrentado” conduz ao passado para descobrir o seu valor.

A Serpente do Túmulo Acorrentado – é um mito
por Julia Keyse
Espero que o resgate do folclore e da história alegrense que reside em preservar o mito através do filme seja uma contribuição de estima à identidade cultural de Alegre. Almejo que o documentário possa servir para estimular um debate sobre como cada sociedade vive e transmiti seus aprendizados às gerações seguintes. Deste modo, sobre o que representa o conjunto de bens de natureza material e imaterial, um senso de identidade e perenidade que se forma a essência da cultura de um povo.

*O documentário a Serpente do Túmulo Acorrenta foi o produto do meu trabalho de conclusão de curso. O mesmo acompanha o artigo intitulado de “A Serpente do Túmulo Acorrentado”, o documentário do mito de Alegre-ES: uma abordagem antropológica cultural.

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